7.5.06

O PROBLEMA DA INDUÇÃO





 
“ ... As tentativas de sistematizar o método científico foram questionadas a partir do século XVIII através do problema da indução ... David Hume levando o empirismo ao ceticismo extremo declara que não há nenhuma necessidade lógica para que o futuro deva se assemelhar ao passado, assim nós somos incapazes de justificar o raciocínio indutivo apenas apelando ao seu sucesso passado ... Embora os argumentos extremamente céticos de Hume fossem refutados pela Crítica da Razão Pura de Immanuel Kant, continuaram a manter uma forte influência ao longo da melhor parte século XIX, e colocaram em debate a validade do método indutivo.




O problema da indução:
“Hume classificava o raciocínio humano em dois tipos, Relações entre Ideias e Estudo dos Fatos. Enquanto o anterior envolve conceitos abstratos como a matemática onde domina a certeza dedutiva, o último se relaciona com a experiência empírica onde todo pensamento é indutivo.
De acordo com Hume, nós não podemos saber nada sobre a natureza antes da experiência, até mesmo um 'homem racional' sem o auxílio da experiência não poderia inferir nada sobre a fluidez e a transparência da água que poderia sufocá-lo, ou da luz e do calor do fogo que poderia consumi-lo. (EHU, 4.1.6). Assim, tudo que nós podemos dizer, pensar, ou predizer sobre a natureza deve vir da experiência prévia que coloca os fundamentos para a necessidade da indução.
A inferência indutiva diz que o passado age como um confiável guia ao futuro; por exemplo, se no passado o sol levantava no leste e se deitava no oeste, então, a inferência indutiva sugere que provavelmente no futuro, o sol, se levantará no leste e se deitará no oeste. Mas como podemos nós justificar tal inferência? Conhecida como o princípio da
indução. Hume sugeriu duas justificações possíveis, mas rejeitou ambas:

1. A primeira justificação indica que por uma questão de necessidade lógica, o futuro deve se assemelhar ao passado. Mas, como assinalou Hume, é possível imaginar a existência de um mundo caótico, errático, onde o futuro não tenha nada a ver com o passado - ou, um mundo exatamente como o nosso até o presente, e de repente as coisas mudam completamente.- Assim nada faz do princípio da indução logicamente necessário.
2. A segunda justificação, mais modesta, apela ao sucesso passado da indução - se alguém trabalhou bastante no passado, provavelmente, continuará a trabalhar muito no futuro. Mas, como nota Hume, esta justificação usa um raciocínio circular em tentar justificar a indução meramente repetindo-a, trazendo-nos de volta por onde começamos.

O notável teórico e filósofo do século XX,
Bertrand Russell, tentou restabelecer a indução como um procedimento racional e restaurar o credibilidade do método científico. Entretanto, tudo que poderia dizer sobre indução é “um princípio lógico independente, incapaz de ser inferido da experiência ou de outros princípios lógicos, e que sem este princípio, a ciência é impossível".
Apesar de criticar a indução, Hume acreditou ser ela superior à dedução no domínio do pensamento empírico. E, declarou: "esta operação da mente, pela qual nós inferimos iguais efeitos das mesmas causas, e versa vice, é essencial à subsistência de todas as criaturas humanas ... " David Hume: Wikipedia



No século XIX, Charles Sanders Peirce propôs um esquema que demonstrou ter considerável influência no desenvolvimento do método científico. O trabalho de Peirce acelerou rapidamente o progresso em diversas áreas. Em primeiro lugar, falando num contexto mais amplo, em "Como Tornar Nossas Idéias Claras" (1878), Peirce elaborou um método verificável objetivamente para testar a validade do conhecimento, de uma maneira que fosse além das meras tentativas triviais, com ênfase na dedução e na indução.
Em segundo lugar, e de importância mais direta ao método científico, Peirce apresentou um esquema básico para testar hipóteses, usado ainda hoje. Extraindo a teoria da investigação do material bruto encontrado na lógica clássica, refinou-a paralelamente ao desenvolvimento da incipiente lógica simbólica para direcioná-la aos problemas ainda atuais do raciocínio científico. Peirce examinou e articulou as três modalidades fundamentais do raciocínio que participam na investigação científica atual, processos conhecidos atualmente como inferência abdutiva, dedutiva, e indutiva.
Em terceiro lugar, colaborou com o progresso da lógica simbólica – certamente sua especialidade principal...
Charles Sanders Peirce : Wikipedia


O grande mérito de Karl Popper (1902-1994) foi apresentar um conjunto de ideias para o aperfeiçoamento do método científico, conhecido como racionalismo crítico. Argumentou que a hipótese deve ser falseada e, conforme Peirce e outros, que a ciência progrediria melhor usando fundamentalmente o raciocínio dedutivo. Sua perspicaz formulação do procedimento lógico contribuiu para evitar o uso excessivo da especulação indutiva, e ajudou também a fortalecer os fundamentos conceituais para os procedimentos que se aplicam a revisão dos pares.
Os críticos de Popper, principalmente Thomas Kuhn, Paul Feyerabend e Imre Lakatos rejeitaram a ideia que existe um único método que se aplica a todas as ciências e que poderia ser responsável pelo progresso científico. (veja também: método científico) -Wikipedia: História do método científico

Karl Popper (1902 – 1994): “... Popper descreve sua filosofia como racionalismo crítico, expressando sua rejeição ao empirismo clássico, e à abordagem indutivo-observacionalista associada ao desenvolvimento científico. Popper reagiu energicamente contra a última, sustentando que as teorias científicas são universais por natureza, e só podem ser testadas indiretamente, através de suas implicações. Sustentou, também, que as teorias científicas, e o conhecimento humano em geral, são apenas conjeturas (hipóteses) geradas pela imaginação criadora a fim resolver problemas levantados em situações histórico-culturais particulares...
De acordo com a lógica, os resultados positivos não podem confirmar uma teoria científica, mas um único contra-exemplo é logicamente decisivo para comprovar a falsidade de uma teoria. A consideração de Popper sobre a assimetria lógica entre a confirmação e a refutação encontra-se no âmago da filosofia da ciência. Tornou a falseabilidade seu critério de demarcação entre o que é, e o que não é verdadeiramente científico: uma teoria deve ser considerada científica, se e somente se, puder ser falseável (refutada). Isto o levou a atacar as pretensões da psicanálise e do Marxismo contemporâneo de adquirir status científico, em cujas bases estão inseridas teorias que não podem ser refutadas (falseáveis)...
Popper escreveu também extensivamente contra a famosa interpretação de Copenhague da mecânica quântica. Discordou energicamente do instrumentalismo de Niels Bohr e apoiou a abordagem realista (científica) de Albert Einstein sobre as teorias científicas a respeito do universo. A falseabilidade de Popper assemelha-se ao falibilismo de Charles Peirce: “Of Clocks and Clouds” (1966), Popper afirmou que desejaria ser reconhecido entre os trabalhos de Peirce... Sobre problema da indução:
Entre suas contribuições à filosofia encontra-se sua resposta ao Problema da Indução de David Hume. A resposta de Popper é característica, e se associa a seu critério de falseabilidade. Ele afirma que como não há nenhuma maneira de provar que o sol se levantará amanhã, nós podemos teorizar (criar a hipótese) que ele nascerá novamente. Se ele não se levantar será refutada...” Karl Popper: Wikipedia



Thomas Samuel Kuhn (1922 - 1996), intelectual americano que escreveu largamente sobre história da ciência e desenvolveu diversas noções importantes sobre filosofia da ciência.
Thomas Kuhn é famoso pelo seu livro A Estrutura das Revoluções Científicas (1962) no qual apresentou a idéia que a ciência não progride através de uma acumulação linear de novos conhecimentos, mas enfrenta revoluções periódicas que ele chama de "mudança de paradigma", em que a natureza da investigação científica numa determinada área é transformada radicalmente...

O livro foi originalmente impresso como um artigo na enciclopédia unificada internacional da ciência, publicada pelos positivistas lógicos do círculo de Viena. O impacto enorme do trabalho de Kuhn pode ser medido nas mudanças que causou no vocabulário da filosofia da ciência: além de "mudança de paradigma", Kuhn retirou a palavra "paradigma", termo usado no contexto lingüístico e ampliou seu significado para o atual uso; cunhou a expressão "ciência normal" como referência ao trabalho rotineiro, cotidiano dos cientistas que trabalham com um determinado paradigma; e foi responsável pelo uso da expressão "revoluções científicas", no plural, que ocorrem frequentemente em diferentes períodos de tempo e em disciplinas diferentes, ao contrário de uma única "revolução científica" no renascimento. O trabalho de Kuhn foi usado extensivamente nas ciências sociais; por exemplo, no debate do pós-positivismo no âmbito das relações internacionais. Kuhn é creditado como uma força fundamental subjacente a pós-
Sociologia Mertoniana de Conhecimento Científico. Thomas Khun: Wikipedia


Paul Karl Feyerabend (1924 - 1994): Seus principais trabalhos são ‘Against Method’ (1975), ‘Science in a Free Society’ (1978) e ‘Farewell to Reason’ (1987). Feyerabend tornou-se famoso pela sua significativa visão anarquista da ciência e pela sua rejeição à existência de regras metodológicas universais. É uma influente personalidade na filosofia da ciência, e também na sociologia do conhecimento científico.
A posição de Feyerabend é vista geralmente como radical na filosofia da ciência, porque ela implica que a filosofia não é capaz de fornecer uma descrição geral da ciência, nem em desenvolver um método para diferenciar as produções científicas das não-científicas como a mitologia. Implica também que os referenciais filosóficos devam ser ignorados pelos cientistas, se quiserem produzir novos conhecimentos.
Para justificar sua posição de que as regras metodológicas geralmente não contribuem ao sucesso científico, Feyerabend fornece contra exemplos declarando que (boa) ciência não opera de acordo com algum método fixo. Ele investigou alguns episódios que na ciência são considerados exemplos inquestionáveis de progresso (i.é, a revolução Copernicana), e mostrou que todas as regras estabelecidas na ciência foram quebradas. Além disso, declarou que aplicar tais regras neste episódio histórico realmente impediria a revolução científica...
... Feyerabend crítica também a falseabilidade. Argumentou que nenhuma teoria interessante é sempre consistente com todos os fatos relevantes. Isto rejeitaria a ingênua declaração da falseabilidade sobre as teorias científicas que devem ser recusadas se não concordarem com os fatos conhecidos...
... O principal exemplo da influência das interpretações naturais que Feyerabend forneceu foi o argumento da torre. O argumento da torre era uma das objeções principais contra a teoria do movimento da terra. Os Aristotélicos supunham que o fato de que uma pedra abandonada do alto de uma torre caísse verticalmente abaixo dela demonstrava que a terra estava em repouso. Acreditavam que, se a terra se movesse enquanto a pedra estivesse caindo, a pedra cairia 'um pouco atrás. “Os objetos deveriam cair diagonalmente em vez de verticalmente”. Desde que isto não acontece, os Aristotélicos pensavam ser evidente a imobilidade da terra. Se usarmos as teorias antigas do impulso e do movimento relativo, a teoria de Copérnico deveria certamente ser falseada (refutada) pelo fato que os objetos caem verticalmente na terra. Esta observação deveria receber uma nova interpretação para fazê-la compatível com teoria Copernicana.
Galileo conseguiu fazer tal mudança sobre a natureza do impulso e do movimento relativo. Antes que tais teorias fossem articuladas, Galileo teve que empregar métodos ‘ad hoc’ e proseguir com uma metodologia indutivista...
... Além disso, possibilita a aplicação de uma metodologia pluralística que envolva comparações entre quaisquer teorias em qualquer instância para melhorar a articulação de cada teoria. Dessa maneira, o pluralismo científico melhora o poder crítico da ciência. Assim Feyerabend propõe que a ciência pode proseguir melhor não pela indução, mas pela contra-indução. Paul Karl Feyerabend: Wikipedia


Imre Lakatos (1922 - 1974) Importante filósofo da matemática e da ciência, sua contribuição para a filosofia da ciência foi a tentativa de resolver o conflito entre a Falseabilidade de Popper e a estrutura revolucionária da ciência descrita por Kuhn. A teoria de Popper indicou aos cientistas que devem abandonar uma teoria assim que encontrarem alguma evidência de falseamento, substituindo-a imediatamente com novas hipóteses de maior alcance e arrojo.
Entretanto, Kuhn descreveu a ciência consistindo de períodos de ciência normal em que os cientistas continuam a acreditar em suas teorias a despeito de anomalias, permeados com períodos de grande mudanças conceituais.

Lakatos procurou uma metodologia que reconcilie estes pontos de vista aparentemente contraditórios, uma metodologia que poderia fornecer uma descrição racional do progresso científico, consistente com o registro histórico.
Para Lakatos, o que nós pensamos como 'teorias’ são realmente grupos de teorias ligeiramente diferentes que compartilham de alguma idéia comum, o que Lakatos chamou seu ‘núcleo duro’ (hard core). Lakatos denomina estes grupos de ‘programas de investigação’. Os cientistas envolvidos no programa protegerão o núcleo duro de tentativas de ‘falseamento’ envolvendo-o com um cinturão protetor de hipóteses auxiliares.

Enquanto que Popper deprecia tais medidas como 'ad hoc', Lakatos quis mostrar que conciliar e desenvolver um cinturão protetor não é necessariamente uma má idéia para um programa de investigação. Em vez de perguntar se uma hipótese é verdadeira ou falsa, Lakatos pergunta se um programa de investigação é progressivo ou degenerativo. Um programa de investigação progressivo é marcado por seu crescimento, junto com a descoberta de novos fatos. Um programa de investigação degenerativo é marcado pela falta do crescimento, ou do crescimento do cinturão protetor que não conduz a novos fatos.

Esta dificuldade com a falseabilidade foi admitida por Popper. A Falseabilidade, (teoria de Popper), declara que os cientistas colocam as teorias à frente e que a natureza ‘grita não’ como forma de uma advertência à inconsistência... Mas para Lakatos, "não propomos uma teoria para que a natureza possa gritar não, ou melhor, nós propomos uma obscura teoria e a natureza ’grita inconsistente’. Esta inconsistência pode ser resolvida sem abandonar nosso programa de pesquisa deixando o ‘núcleo duro’ isolado, somente alterando as hipóteses auxiliares.
Um exemplo claro são as três leis do Newton do movimento. Dentro do sistema newtoniano (programa de pesquisa) elas não estão abertas à falseabilidade porque formam o ‘núcleo duro' do programa. Este programa de pesquisa fornece uma estrutura dentro do qual a pesquisa pode ser empreendida com referência constante aos primeiros princípios presumidos que são compartilhados por aqueles envolvidos no programa de pesquisa. De modo é similar à noção de Kuhn de paradigma. Lakatos acreditou também que um programa de pesquisa contém ‘regras metodológicas’ em que, algumas delas, instruem quais trajetos da pesquisa evitar ('heurística negativa') e de algumas que instruem em que trajetos prosseguir ('heurística positiva').
Lakatos declarou que nem todas mudanças de hipóteses auxiliares dentro dos programas de pesquisa (' mudança no problema’) são igualmente aceitáveis. Acreditou que estas 'mudanças no problema’ podem ser avaliadas ou por sua habilidade de explicar aparentes refutações ou por sua habilidade de produzir fatos novos. Se puder ser feito, Lakatos declara que são progressivas. Entretanto se não, se forem justamente mudanças 'ad hoc' que não conduzem à predição de fatos novos, então recebem o rótulo de degeneradas.
Lakatos acreditou que se um programa de pesquisa for progressivo, então é racional para os cientistas efetuar mudanças nas hipóteses auxiliares a fim de protegê-las das anomalias. Entretanto, se um programa de pesquisa for degenerativo, então enfrenta o perigo de seus concorrentes, ele pode ser ' refutado ' sendo substituído por um melhor (i.e. por um mais progressivo) ... Imre Lakatos: Wikipedia

Links



Empirismo
Racionalismo
Iluminismo
Humanismo
A aventura histórica da construção dos fundamentos do conhecimento científico. "O que é metodologia científica": Alex Carvalho, Eleni Moreno, Francisco Rogerio de O. Bonatto e Ivone Pereira
Portal: Philosophy of Science
Philosophy of Science: Wikipedia
Causal Determinism
Empiricism, Semantics, and Ontology: R. Carnap
Bayesian Probability
Constructivist Epistemology
Ética e Ciência: José Roberto Goldim. / UNESCO
O que é Ciência afinal? Attico I. Chassot
Occam's razor (Navalha de Occan)
Raven paradox (Paradoxo do Corvo)

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